A Dexametasona é um medicamento pertencente à classe dos glicocorticoides. Os glicocorticoides têm a sua atividade terapêutica devido a sua potência como anti-inflamatórios e imunossupressores. Várias são as doenças tratadas com os glicocorticoides: doenças de origem reumática, imunológica, cutânea, ocular, endocrinológica, pulmonar, sanguínea, gastrintestinal, neurológica e neoplásica. Apesar da ampla utilização, a dexametasona pode provocar inúmeros efeitos colaterais e adversos, e sua gravidade depende da dose que é administrada (Up to Date, 2020).

Estudos mais recentes envolvendo a Dexametasona no tratamento contra a COVID-19, nos quais inicialmente o fármaco era contraindicado, mostraram a sua eficácia na forma moderada e grave da doença. A Sociedade Brasileira de Infectologia (SBI) recomenda o uso da dexametasona nos casos mais graves da doença, na dose de 6mg durante 10 dias (ABEM,2020).

 

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Um estudo realizado pelo Recovery (Randomised Evaluation of COVID-19 Therapy) mostrou os resultados em 2104 pacientes selecionados aleatoriamente, medicados com o glicocorticoide por via oral ou intravenosa. Esses pacientes foram comparados com outros 4321 pacientes tratados convencionalmente. Os resultados mostraram redução significativa de mortes para pacientes que precisaram de respiradores/suporte de oxigênio. Com relação aos pacientes com a forma leve da doença, não houve melhora significativa dos sintomas (THE RECOVERY COLLABORATIVE GROUP, 2020).

Os glicocorticoides são potentes anti-inflamatórios e reduzem a inflamação, por vezes grave, em pacientes com a COVID-19. A utilização dos glicocorticoides também pode limitar ou prevenir a evolução da reação do organismo para a “tempestade de citocinas”, que pode induzir o aparecimento da Síndrome da Angústia Respiratória Aguda Grave (SARA), com consequente hipoxemia, insuficiência respiratória, podendo levar ao óbito (YANG, et al, 2020; SURVIVING SEPSIS CAMPAIGN, 2020). Por outro lado, o uso da dexametasona pode agravar o quadro de pacientes que apresentam estados leves da doença.

 

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Dessa forma, conclui-se que:

  • em pacientes com a COVID-19 que não necessitavam de suporte respiratório, ou seja, quadros mais leves, NÃO foram verificados quaisquer benefícios com o uso da medicação;
  • a Dexametasona possui uma série de efeitos colaterais, que são maiores conforme a quantidade e o tempo de utilização. Seu uso sem indicação médica pode expor a inúmeros riscos desnecessários à saúde, como a hiperglicemia, retenção de sal e água, hipertensão, diminuição da absorção de cálcio, dentre outros;
  • a Dexametasona tem ação anti-inflamatória e imunossupressora (redução da atividade do sistema imune);
  • os resultados mostraram redução significativa de mortes para pacientes que precisaram de respiradores/suporte de oxigênio. Com relação aos pacientes com a forma leve da doença, não houve melhora significativa dos sintomas;
  • portanto, a medicação não tem qualquer ação na prevenção contra o coronavírus, uma vez que não age atacando o vírus, mas regulando a resposta imune e a inflamação excessivas. Além disso, seu uso no início do quadro pode apresentar riscos de piora, uma vez que a Dexametasona pode causar uma imunossupressão (diminuição da atividade do sistema imune) que favoreceria a replicação viral.

Somente uma minuciosa avaliação médica é que pode indicar o momento propício, assim como a quantidade e o tempo de uso de qualquer medicação, a fim de que os benefícios sejam superiores aos riscos, sendo a automedicação um comportamento que pode trazer prejuízos à saúde, tanto os relatados anteriormente, como inúmeros outros. Além dos danos associados à automedicação, há também os que têm como causa a interrupção de um medicamento com indicação médica por conta própria: tanto o início, quanto a suspensão, devem ser feitos seguindo a recomendação de seu médico.

 

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Referências

Associação Médica Brasileira. Disponível em: Sociedade Brasileira de Infectologia. https://ammg.org.br/wpcontent/uploads/f590ba9af0faf1a1490ef0b5f945b9c136dceba586b6fa18b86852927fe72b54.pdf. Acesso em: 15 abr. 2021.

Dexamethasone (systemic): Drug Information. UptoDate. Disponível em: https://www.uptodate.com/contents/dexamethasone-systemic-drug-information. Acesso em: 15 abr. 2021.

GOLAN, David E. Princípios de farmacologia: a base fisiopatológica da farmacoterapia. 2. ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2009.

Low-cost Dexamethasone Reduces Death by Up to One-third in Hospitalised Patients with Severe Respiratory Complications of COVID-19. Recovery, 2020. Disponível em: https://www.recoverytrial.net/news/low-cost-dexamethasone-reduces-death-by-up-to-one-third-in-hospitalised-patients-with-severe-respiratory-complications-of-covid-19. Acesso em: 18  jun.  2020.

PINHEIRO, Pedro. Dexametasona – bula para pacientes. MD. Saúde, 2020. Disponível em: https://www.mdsaude.com/bulas/dexametasona/. Acesso em: 18 de jun. 2020.

SANTOS, Luciana dos. Medicamentos na Prática da Farmácia Clínica. 1 ed. São Paulo: Artmed, 2013.

Society of Critical Care Medicine – SURVIVING SEPSIS CAMPAIGN – Covid-19 Guidelines (2020). Disponível em: https://www.sccm.org/SurvivingSepsisCampaign/Guidelines/COVID-19. Acesso em: 15 abr. 2021.

THE RECOVERY COLLABORATIVE GROUP, 2020. Disponível em: https://www.nejm.org/doi/full/10.1056/NEJMoa2021436?source=nejmtwitter&medium=organic-social. Acesso em: 15 abr. 2021.

YANG, Z.; LIU, J.; ZHOU, Y.; ZHAO, X.; ZHAO, Q.; LIU, J. The Effect of Corticosteroid Treatment on Patients with Coronavirus Infection: a Systematic Review and Meta-analysis. Journal of Infectology, v. 81, n. 1, e13-e20, 2020.

 

FICHA TÉCNICA

Autores: Maria Clara Cavalcanti Espósito, graduanda em Medicina pela Universidade Federal de São Carlos – UFSCar; Uliana Pereira da Silva Lisboa, graduanda em Medicina pela Universidade Federal de São Carlos – UFSCar.

Atualização do texto: Cristina Helena Bruno

Revisora: Cristina Helena Bruno, Farmacêutica-Bioquímica pela FCFar-UNESP – Doutora em Ciências (Bioquímica, Biologia Molecular e Farmacologia) pela Universidade Federal de São Carlos – UFSCar; professora Associada do Departamento de Medicina da Universidade Federal de São Carlos – UFSCar.

Revisão Linguística: Laianny Martins Silva Efel, jornalista, mestra em Comunicação pela Universidade Federal de Goiás – UFG, colaboradora da comunidade externa.

Créditos da imagem: Racool Studio no Freepik

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Autor

  • Cristina Helena Bruno

    Farmacêutica-Bioquímica (UNESP,1994), Mestre em Ciências Biológicas (UNESP, 2000) e Doutora em Ciências (UFSCar, 2004). Pós-Doutora em Nanotecnologia Farmacêutica (UNESP, 2007-2009; 2014-2015). Docente do Curso de Farmácia (UFES, 2009-2017). Chefe da Unidade de Farmácia Clínica do HU-UFSCar (2015-2017) e docente do Curso de Medicina (UFSCar, 2017 – atual). Temas de interesse: infecção hospitalar/uso racional de medicamentos, Farmacologia Clínica, adesão à tratamento de doenças. Email: crishbruno@gmail.com

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