Autoria: Giovana Meloni Craveiro

Descrição da obra: A obra retrata uma nova perspectiva, sobre a própria casa e os próprios sentimentos, advinda do período de isolamento social.

Expressão: Literatura.

 

Um dia a menos

A mulher não queria abrir os olhos. Já amanheceu cansada. O travesseiro sussurrou em seu ouvido que ela podia continuar ali pois ninguém perceberia. Disse que ela não tinha lugar nenhum para ir e dever nenhum de ser produtiva até porque o mundo todo está parado.

O cobertor queria se aconchegar nela e fez birra quando ela fez menção de se levantar. Quase a convenceu. Mas ela mandou que se comportasse, conforme carinhosamente vestia os lençóis e então o cobertor no colchão na esperança de que isto lhe motivasse a viver o dia. Motivou um pouco. Abriu também as janelas, que então lhe entregaram a luz do sol, e isto ajudou.

No caminho até a cozinha, as paredes suspiravam um bom dia desanimado como ela própria. Perguntou à geladeira o que tinha para o café da manhã. A geladeira lhe ofereceu um bolo de ontem. Pediu um copo de água para o filtro e esperou alguns segundos enquanto ele cumpria seu pedido. Com o pratinho de bolo em uma mão e o copo de água na outra, caminhou até a mesa do quintal. Queria sentir como se saísse de casa então precisava mudar o ambiente. Ao sentar-se junto à cadeira e à mesa, pediu a esta última que gentilmente segurasse seu café da manhã, enquanto comesse; pedido que foi atendido. O copo beijou seus lábios e lhe confidenciou que adorava poder passar tanto tempo com ela.

Ela lhe devolveu um sorriso triste.

Terminada a refeição, e depois de despedir-se do pratinho e entregá-lo para a pia, dirigiu-se à sala, onde começaria as tarefas do dia. Pegou seu computador que descansava na mesa de jantar e foi se acomodar junto a ele e a seu copo de água meio vazio no sofá, o qual a abraçou com ternura. Passou horas trocando olhares com o relógio, impaciente para enxergar nele algum horário que fosse próximo o suficiente do que se poderia considerar o fim do dia. Com os olhos cansados, a mulher fechou a tela do computador e esbravejou que não aguentava mais, tudo lhe dava raiva. A mesinha de centro concordou.

Finalmente, a mulher se perguntou se estava imaginando coisas de tanto ficar em casa. Os móveis também.

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