Cientistas em todo o mundo tentam desvendar o novo coronavírus e as formas como ele age no sistema respiratório. Aos poucos, surgem respostas que são direcionadas aos profissionais da linha de frente para melhorar o atendimento aos pacientes, mas diversas dúvidas ainda persistem. “As explicações ainda estão no campo das hipóteses”, diz o fisioterapeuta e pesquisador Juliano Ferreira Arcuri.
Professor substituto na Universidade Federal de São Carlos (UFSCar) e na Unimogi, ele comenta na entrevista a seguir o que já foi descoberto em relação à ação do SARS-CoV-2 nos pulmões, como a fisioterapia respiratória pode ajudar os pacientes e o uso de oxímetros na detecção da COVID-19.
Estamos vivenciando uma pandemia ocasionada pela COVID-19. O senhor poderia explicar os impactos dessa doença no sistema respiratório?
O impacto no sistema respiratório ainda não é totalmente conhecido, muitas pesquisas estão acontecendo para tentar investigar a fundo.
O que já se sabe é que, em primeiro lugar, a infecção pelo vírus é diferente de pessoa para pessoa, então algumas não têm sintomas, outras têm sintomas leves e outras têm sintomas graves, dificuldade para respirar e precisam do suporte de um hospital para sobreviver.
De forma simplificada, o que acontece com esses pacientes que têm dificuldade de respirar intensa, com necessidade de oxigênio ou ventilação mecânica, é que, quando o pulmão é infectado, ele tem uma inflamação e uma das consequências é que ele incha nas áreas afetadas. Esse inchaço dificulta a passagem do oxigênio que está no ar respirado para o sangue, aí falta oxigênio no sangue para que a pessoa possa continuar viva.
Nesse contexto, qual a importância da fisioterapia respiratória? Os exercícios para fortalecimento da musculatura respiratória são indicados para todos?
A fisioterapia respiratória está indicada para todos os pacientes com COVID-19 que tenham sintomas, mesmo os leves. Há essa indicação porque o fisioterapeuta trabalha não somente para dar suporte à respiração dos pacientes por meio do oxigênio e ajustando a ventilação mecânica, mas também dando apoio e incentivo para que as pessoas com essa doença continuem se movimentando para não perderem tanta massa muscular e terem condições de depois voltar às suas atividades.
O fortalecimento dos músculos respiratórios é indicado para aqueles pacientes que perderam força respiratória, em especial aqueles que precisaram usar por algum tempo a ventilação mecânica, nos quais os músculos perderam força pois “deixaram de trabalhar”. Os exercícios também estão indicados para os pacientes que, por alguma doença crônica, já tinham perdido força muscular respiratória e agora precisam melhorá-la para, caso sejam infectados pela COVID-19, ter força suficiente para passar pelo período de infecção com menos risco.
Considerando o quadro de síndrome respiratória aguda grave (SRAG), quais as proposições terapêuticas?
Temos duas linhas de frente. A primeira é manter a quantidade de oxigênio necessária para o corpo e a retirada do gás carbônico, e isso se dá, nos casos graves, por meio de ventilação mecânica com parâmetros muito específicos (usando pressões diferenciadas, estratégia protetora para evitar lesão pulmonar induzida pelo ventilador e ofertando oxigênio necessário).
A segunda linha de frente está relacionada ao entendimento de que essas pessoas precisam estar bem quando tiverem alta, já que vão precisar voltar a andar, fazer suas atividades e trabalhar. Se elas passarem dias deitadas e sem se movimentar, podem perder tanta força que não vão conseguir voltar para essas atividades. Nesse caso, precisamos fazer exercícios para diminuir a perda de força, resistência muscular e coordenação motora. Esses exercícios dependem de uma prescrição para aquela pessoa e para aquele momento, lembrando que o fisioterapeuta vai conseguir saber qual deve ser esse exercício e qual a intensidade segura.
Profissionais de saúde no Brasil e no mundo começam a relatar casos de “pneumonia silenciosa” relacionada à COVID-19, em que os pacientes têm pneumonia e uma oxigenação no sangue abaixo do normal, mas não apresentam dificuldade para respirar. Na sua opinião, há informação suficiente para embasar a recomendação de compra de oxímetros? Eles podem ajudar na detecção da doença?
Apesar de estarmos avançando no reconhecimento das diferentes formas de apresentação da COVID-19 nos pacientes, as explicações ainda estão no campo das hipóteses, ou seja, muita gente no mundo está tentando explicar a doença, lançando ideias que ainda precisam ser verificadas por estudos.
Dessa forma, o que devemos ter em mente ao buscar melhores formas de tratar o paciente são as recomendações das sociedades científicas, que estão saindo muito rapidamente, sempre que algo promissor aparece. Considerando entidades como a “Associação Brasileira de Fisioterapia Cardiorrespiratória e Fisioterapia em Terapia Intensiva” (Assobrafir), a Sociedade Brasileira de Pneumologia e Tisiologia (SBPT) e a Associação Brasileira de Medicina de Emergência (Abramede), ainda não há recomendação para que as pessoas se preocupem em comprar oxímetros de pulso, aparelhos que medem os níveis de oxigênio no sangue. Assim, até o momento, é melhor procurar um serviço de saúde em caso de dúvida sobre sintomas e diagnóstico.
É importante destacar aqui que, neste momento de desinformação e de excesso de informação em relação à COVID-19, as notícias devem ser consumidas com otimismo e seriedade. Quando você ouvir falar de cura ou de novas formas de diagnóstico, fique feliz, mas não tome decisões precipitadas, não assuma para si a responsabilidade de conseguir acesso a essas novidades. Muitas notícias vêm de profissionais que têm ideias e querem ajudar, mas é preciso considerar muitos outros elementos antes de algo poder ser distribuído para todos.
O ideal é procurar um serviço de saúde e, se houver desconfiança em relação aos profissionais, buscar uma segunda opinião. Em vez de “brigar” conosco, lembre-nos da sua confiança e da expectativa de que estejamos atualizados para enfrentar a doença. Iremos passar juntos por essa situação difícil.
Versão em Libras:
Elaborado por:
Esther Angélica Luiz Ferreira
Tatiana Barbieri Bombarda
Juliana Morais Menegussi
Stefhanie Piovezan
Acesse a segunda parte da entrevista: Pesquisador tira dúvidas sobre extubação paliativa no contexto da COVID-19.
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Créditos da imagem: Starline no Freepik
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Excelente entrevista, muito esclarecedora. Particularmente, cheguei a pensar em comprar um oxímetro e o entrevistado tirou a dúvida. Como prevenção, manter atividade física e exercícios respiratórios é imprescindível.
Ótimo artigo, parabéns.