No início desta semana, na grande mídia e nas redes sociais, foram recepcionados com grande entusiasmo os dados preliminares de uma pesquisa que está sendo conduzida pela Universidade de Oxford, apontando para uma redução da mortalidade entre 20% e 35% com o uso de Dexametasona (um glicocorticoide sintético), por pacientes que necessitavam de suporte respiratório (ventilação mecânica ou oxigenoterapia), em comparação com um grupo controle (grupo que não recebeu Dexametasona, apenas cuidados usuais). 

Entretanto, vale ressaltar:

  • Em pacientes com COVID-19 que não necessitavam de suporte respiratório, ou seja, quadros mais leves, NÃO foram verificados quaisquer benefícios com o uso da medicação.
  •  A Dexametasona possui uma série de efeitos colaterais, que são maiores conforme a quantidade e o tempo de utilização. Seu uso sem indicação médica pode expor a  inúmeros riscos desnecessários à saúde, como a hiperglicemia, retenção de sal e água, hipertensão, diminuição da absorção de cálcio, dentre outros.
  •  A Dexametasona tem ação anti-inflamatória e imunossupressora (redução da atividade do sistema imune). Em casos mais graves de pacientes acometidos pelo coronavírus, foi observada uma atuação do sistema imune e uma consequente resposta inflamatória muito aumentadas, o que levaria a lesões teciduais.
  • Portanto, a medicação não tem qualquer ação na prevenção contra o coronavírus, uma vez que não age atacando o vírus, mas regulando a resposta imune e a inflamação excessivas. Além disso, seu uso no início do quadro pode apresentar riscos de piora, uma vez que a Dexametasona pode causar uma imunossupressão (diminuição da atividade do sistema imune) que favoreceria a replicação viral.

Somente uma minuciosa avaliação médica é que pode indicar o momento propício, assim como a quantidade e o tempo de uso de qualquer medicação, a fim de que os benefícios sejam superiores aos riscos, sendo a automedicação um comportamento que pode trazer prejuízos à saúde, tanto os relatados anteriormente, como inúmeros outros. Além dos danos associados a automedicação, há também os que tem como causa a interrupção de um medicamento com indicação médica por conta própria: tanto o início quanto a suspensão devem ser feitas seguindo a recomendação de seu médico.

Por fim, é importante destacar que a pesquisa ainda não foi finalizada nem publicada. Para que um artigo seja publicado, ele passa por uma revisão por outros cientistas, que analisam uma série de indicadores de qualidade da pesquisa. Portanto, somente com essa finalização e posterior publicação é que se poderá avaliar melhor os resultados encontrados.

 

Referências

Dexamethasone (systemic): Drug information. UptoDate. Disponível em: https://www.uptodate.com/contents/dexamethasone-systemic-drug-information. Acesso em: 18 de jun. de 2020.

GOLAN, David E. Princípios de farmacologia: a base fisiopatológica da farmacoterapia. 2. ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2009.

Low-cost dexamethasone reduces death by up to one third in hospitalised patients with severe respiratory complications of COVID-19. Recovery, 2020. Disponível em: https://www.recoverytrial.net/news/low-cost-dexamethasone-reduces-death-by-up-to-one-third-in-hospitalised-patients-with-severe-respiratory-complications-of-covid-19. Acesso em: 18 de jun. de 2020.

PINHEIRO, Pedro. Dexametasona – bula para pacientes. MD.Saúde, 2020. Disponível em: https://www.mdsaude.com/bulas/dexametasona/. Acesso em: 18 de jun. de 2020.

SANTOS, Luciana dos,. Medicamentos Na Prática da Farmácia Clínica 1 ed. São Paulo Artmed, 2013. 

 

Créditos da imagem: Rawpixel no Rawpixel

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Autor

  • Uliana Pereira da Silva Lisboa

    Aluna da graduação em Medicina na Universidade Federal de São Carlos; Diretora de comunicação da Liga de Química Medicinal e Farmacologia Clínica da Universidade Federal de São Carlos - Gestão 2020

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