Autoria: Matheus Naia Fioretto
Descrição da obra: Primeira parte se encaixo no âmbito referente à poesia específica. A segunda é uma continuação num formato um pouco distinto, tracejando uma conversa entre diferentes momentos e pensamentos diários que habitam meu ser.
Expressão: Literatura
Obra 1
Dança do “eus”
Há muito tempo não escutava…
Ah… Quanto tempo…
As horas sempre apressavam-se
Escorriam pelos dedos
E tudo voava
Ofuscado, sem a leveza dos beija-flores
Padecendo num silêncio coletivo, ensurdecedor
Com milhões de palavras navegando
No vazio das estranhas
Aprisionadas num âmbito de dor.
Tanto tempo…
Perdidos em um caminho tão linear, irrisório
No qual os jardins deram espaço aos espinhos
Que arranhavam desencontros dos olhares e horizontes
Corrompendo as lascas de memórias
Apedrejadas pela falta de instantes
Varridas em um vendaval de anseios…
Ah… Quanto tempo…
Não sentia esse silêncio
Não me ouvia, via
Num espelho mais sincero
Na simplicidade de sorrisos fúteis
De banalidades cristalinas…
Felicidade é saber que ainda há tempo
De dançar as metáforas perdidas no passado
De me reencontrar no presente
E brindar
Com o meu ser mais profundo
Com o “eu” que sabe realmente sonhar.
Obra 2
Diálogos internos
– Olá, tudo bem?
– Estar bem é algo um tanto quanto complexo, não? Mas e você?
– A complexidade é dócil e passível de se mergulhar, me atraí muito. Mas enfim, estou apreciando
a mim mesmo, degustando-me, eu diria.
– Parece-me bem empolgado, flertando com o nada. Mas como é?
– Ah. Às vezes olho pra sombra do meu existir e vejo histórias monocromáticas, mas consigo
delineá-las em cores tão magníficas que todo horizonte se assemelha a elas.
– Oras, quanta felicidade. Não te falta um pouco de solidão expressiva? Realismo? Suas cores
me parecem exacerbadas, porque só vejo a noite e toda sua imensidão enegrecida e, mesmo
que pareça algo hiperbólico, esse mar negro do anoitecer arregaça minhas feridas mais
profundas, debruça meu estômago e expulsa minhas borboletas.
– Isso soa tão fúnebre. Não adianta conjuntar as dores a caixões cerimoniosos. Precisa sentir um
pouco da brisa do amanhecer, ouvir os pássaros, beber dos ventos matinais e ver o sublime do
dia. Dar uma volta com as metáforas. O nascer do Sol é algo surreal e real, fascinante. As pupilas
se arrepiam ao vê-lo brincar de acordar, e cozinha toda sinestesia, prepara todo o prato principal
que é o de sentir-se vivo.
– Isso é como trem que grita e não vem. Parece adestrar as patologias da vida e torná-las afáveis
e palpáveis. Prefiro sonhar. Me acalento. Sinto parte de mim, sinto o meu eu, sinto-me como sou.
Tudo é mais estupendo. Assim me afundo pela noite com as angústias vigentes. E fujo delas.
Deleito-me à cama das minhas inquietudes e jogo-as ao meu inconsciente.
– Façanhosa sua tentativa de se negar. Mas pensa. A vida é uma mistura de complexidades
antagônicas e adjacentes. Aceitar a felicidade é algo dócil. Mas aceitar a tristeza é algo amargo,
todavia necessário. É como mergulhar no mar, em dia quente, e sentir o gelado, no início, terrível.
Mas depois refrescante. Vivemos numa montanha-russa. A vida é como diálogo fugaz. Acaricia
e deixa farpas, espinhos. Eu apenas sinto a tristeza e deixo-a esvair. Para assim dançar com os
meus sorrisos, e deixar a sinfonia estremecer as minhas pupilas.
– Vejo suas colocações como devaneios. É feliz demais. É utópico, quimera dos sentidos. A
tristeza e a felicidade têm uma separação tão tênue que eu não me arrisco a brincar nessa corda.
Prefiro olhar pra Lua, despedir-me e despir minha alma aos sonhos desvairados. Os espinhos
não trazem junto o florescer, parecem esquecer dos pássaros que passeiam pelos jardins
românticos. Me despeço agora. A lua me chama para uma o adormecer do meu refluxo interno.
– E eu me despeço para esboçar pinturas e palavras que estão na realidade, como favos de mel,
degustarei dos gostos e desgostos da minha sinestesia maluca de viver. Rir e sorrir ao som dos
meus fluxos e refluxos internos, voando e pousando com as borboletas do meu estômago e do
meu hipocampo.
– Ah, você é otimista demais, precisa sofrer. Ou correr dos quadros reais.
– Ah, você é pessimista demais, precisa aceitar sorrir. Brincar mais com o espelho.
Ahh, vocês confundem minha cabeça assim
Não sei se me abraço ou se fujo de mim mesmo
Uma loucura interna que grita na minha mente
Incessantemente
Vocês nadam e flutuam pelas minhas pupilas
Dia e noite, noite e dia
Antagonismo demais para morarem dentro de mim
Mas dialogam, me completam
Continuem e…
Que essa história louca se mantenha assim… até o fim.