A Covid-19 avança nos territórios indígenas e também atinge indivíduos que vivem em centros urbanos e fora das terras indígenas. O Ministério Público Federal (MPF), lideranças e organizações indígenas questionam o papel da Secretária de Especial de Saúde Indígena (SESAI) no cuidado e na notificação dos óbitos por Covid-19 dos indígenas.

O primeiro caso de óbito de indígena por Covid-19, uma mulher de 87 anos da etnia Borari, ocorreu em Alter do Chão, Santarém-PA, no dia 19/03. O segundo caso, um homem da etnia Mura de 55 anos, aconteceu em Manaus no dia 05/04. Porém, nenhum dos dois foi contabilizado nos Boletins Epidemiológicos da SESAI por se tratar de indígenas “não-aldeados” e estarem fora da terra indígena.

Oficialmente, segundo dados dos Distritos de Saúde Especiais Indígenas (DSEIs), o primeiro óbito notificado aconteceu no dia 09/04: tratava-se de um jovem yanomami de 15 anos que testou positivo para Covid-19 e foi internado no Hospital Geral de Roraima (HGR), em Boa Vista, onde veio a falecer. O segundo e terceiro casos oficiais aconteceram no dia 11/04: uma indígena Kokama, de 44 anos, e um indígena da etnia Tikuna, de 78 anos.

Para o Secretário Especial de Saúde Indígena, Robson Santos da Silva, segundo reportagem do Instituto Sócio Ambiental (ISA), a SESAI deve atender indígenas aldeados e o monitoramento do órgão de casos suspeitos, confirmados e de mortes por Covid-19 só deve considerar esses indígenas. Assim, para o secretário, a morte de indígenas “não aldeados” não deverá ser computada nos números da SESAI: os “não aldeados devem ser atendidos pelos serviços convencionais do SUS”, declarou.

Já o MPF afirmou em comunicado que “todas as medidas devem assegurar o atendimento, de acordo com o regramento constitucional da saúde indígena, que prevê atendimento específico e diferenciado a esses povos, com respeito às práticas e tradições de todos os indígenas do país, Independente do local onde vivem: quem vive em centros urbanos ou fora de terras indígenas já reconhecidas também devem receber os cuidados para evitar a expansão do novo coronavírus”.

Até o dia 15/04, o Boletim Epidemiológico da SESAI informava 22 suspeitos, 17 casos confirmados, 37 descartados e 3 óbitos. O Boletim do ISA, por sua vez, usa os dados oficiais e informa 3 óbitos de indígenas que vivem em área rural, mas alerta que não estão sendo computados os casos de óbitos na cidade: o “atendimento aos indígenas que vivem nas cidades está sendo feito nas estruturas de saúde municipais e estaduais – fora do sistema de saúde indígena. Não há um monitoramento oficial desses casos”.

A Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (APIB) se manifestou por meio de uma carta na qual reivindica a notificação de todos os casos: “Nós da APIB repudiamos o racismo institucional da Secretaria Especial de Saúde Indígena (SESAI) que não está acompanhando e contabilizando os casos de contaminação e mortes dos indígenas que vivem em áreas urbanas. Reforçamos a importância do acompanhamento dos indígenas dentro e fora dos nossos territórios”.

Autoria: grupo Saúde dos Povos Indígenas.

Saiba mais:

Boletim epidemiológico da SESAI

Boletim epidemiológico da plataforma do Instituto Sócio Ambiental (ISA)

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Créditos da imagem: Taylor Ruecker no Unsplash

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Autor

  • Mariana de Almeida Prado Fagá

    Médica de família e comunidade, professora do Departamento de medicina da UFSCar, interesse em temas relacionados com atenção primária à saúde (APS), saúde indígena, trabalho e inclusão, saúde mental na atenção primária.

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